“Hoje o Estado dirige a
economia e se passa por empresário; supervisiona a educação e administra o
ensino em todos os níveis; intervém na vida da família e inclusive promove
planos de controle de natalidade. Em plena monarquia absoluta – cujo apogeu na
França coincidiu com o reinado de Luis XIV – o Estado não fazia nada disso,
embora desse os primeiros passos na política de uma economia dirigida, pálida
imagem da que atualmente temos ante nossos olhos. As autoridades sociais
daquela época, embora já sem o poder e o prestígio que haviam gozado em séculos
anteriores, desempenhavam, em sua esfera de ação, um papel de grande
importância, o que implicava numa ampla descentralização na sociedade política.
Se nos remontássemos a épocas mais distantes, veríamos o vigor com que essas
autoridades sociais, nas monarquias cristãs da Idade Média, limitadas e
representativas, cumpriam tarefas que ninguém imaginava que pudessem
ser exercidas pelo soberano, ao qual correspondia salvaguardar o interesse de
toda coletividade, manter a paz e fazer cumprir a justiça, sem imiscuir-se nem
na organização do trabalho que incumbia às corporações de ofício, nem no
ensino, nem na assistência social proporcionadas pela Igreja, nem nas Universidades
que desfrutavam da autonomia que foi perdida com a intromissão estatal. Mas não
era apenas isso. Até mesmo o poder de policia, a faculdade de tributação e a
força armada escapavam das mãos do monarca, pois os senhores feudais mantinham
a ordem pública em seus domínios, cobravam impostos e mobilizavam tropas quando
ainda não haviam exércitos permanentes. Então, o que fazia o rei? Muito pouco. E
onde estava o Estado: na verdade, eclipsou-se na sociedade feudal. A Idade
Média, como já foi dito, foi a idade de ouro das comunidades, ao irradiar-se as
funções do Estado no conjunto orgânico das sociedades. A fragmentação da
soberania e a descentralização são as duas marcas características apontadas
pelos juristas e historiadores ao caracterizar o feudalismo”.
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José Pedro GALVÃO DE SOUSA. El cambio del
Estado, Revista Verbo, Madri, ns. 235-236, p. 595-596.
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