quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

DIÁLOGO

Tomei novo ao vocábulo, outrora límpido e belo, e só o empregarei para designar os de Platão ou semelhantes. Certamente o amigo quer-me perguntar se espero “melhores relações” ou “menos atritos” ou “maior entendimento” entre o novo governo e os eclesiásticos que nos últimos anos tantas vezes perturbaram a ordem publica a favor de uma caricatura de “justiça social” que hoje só pode ser engolida pelos tolos irremediavelmente tolos.
Posta a pergunta nesses termos, posso ainda simplificá-la a bem da clareza: terei eu esperanças de melhor comportamento cívico da CNBB e dos eclesiásticos desordeiros por conta própria?
Mesmo sem ser profeta nem adivinho, esboço o meu temor: não acredito no progresso ou no amadurecimento da maioria episcopal que fala a língua das esquerdas e pensa que pensa pelo pensamento delas. Não vejo possibilidade de emenda onde não se vê o mais débil sinal de contrição ou atrição. Eles estão satisfeitos e felizes. Depois de terem engolido a ideia central: que a Igreja deve acompanhar as andanças do “mundo” para não ficar atrasada; depois de terem achado luminosas as “aberturas” para as ruas nos momentos e lugares de maior perversão; depois de terem acreditado que a razão está com aqueles que vinte anos atrás eram inimigos da Igreja; depois de um novo credo descobrem entusiasmados que estão aqui, como “Igreja”, para agradar aos homens até o desprezo de Deus...
As pessoas que fazem essas sucessivas descobertas deveriam, decentemente, aliviar-nos de suas presenças nos lugares católicos. Deveriam ser mais sinceras. Enganam-nos elas tão deslavadamente? Ou enganam-se primeiro a si mesmas para depois nos enganarem? Não sei. A profissão de fé que fazem de mil modos todos os dias, sem incluir a singela declaração “não sou católico”, é todavia equivalente. Se eu disser que um Tal não é católico não me acusem de juízo temerário. Longe de mim essa pretensão de sondar os rins e o coração. Direi que Dom Tal tantas e tantas vezes declarou aos quatro-ventos suas ideias não-católicas que, vencido e fatigado, me inclino dizendo: - Acredito, acredito...
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Gustavo CORÇÃO. Melhores relações, em “O Globo”, 7/3/74.

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