“A filosofia liberal e a do Estado
totalitário são duas modalidades do imanentismo moderno no pensamento político.
Aí temos, respectivamente, o imanentismo da liberdade e a divinização do
Estado, concebido como um absoluto, como a encarnação da ideia ética. A
liberdade, para os liberais, deixa de ser ordenada a um fim pessoal
transcendente; e concretamente, na perspectiva do totalitarismo, ela resulta da
total subordinação dos indivíduos e dos grupos ao Estado, isto é, ao fim
imanente deste.
No primeiro caso, a dimensão social
da liberdade desaparece. No segundo caso, o homem é inteiramente socializado
numa completa ‘estatização’ da vida.
Uma das razões dos fracassos a que
se têm exposto as democracias modernas, está em que seus regimes constitucionais,
estruturados segundo os princípios do liberalismo desvinculam o homem dos
grupos orgânicos, cujo fortalecimento preserva as liberdades e cujo
desaparecimento ou enfraquecimento as deixam sem defesa. Em face de tais regimes
de uma liberdade meramente abstrata, Hegel percebeu que nesses grupos as
liberdades concretamente são asseguradas, mas, fazendo do Estado a síntese
absorvente de toda a sociedade, preparou o monismo totalitário.
O liberalismo desconhece o princípio
de subsidiariedade, fundado na autonomia dos grupos intermediários: em relação aos
quais o Estado deve exercer uma função supletiva, para atender às suas deficiências.
Por falta desse enquadramento social, abandona as liberdades individuais umas
em face das outras, deixando-as, assim, desprotegidas para enfrentar a concorrência.
Dessa forma, na competição da struggle
for life, a liberdade dos mais fracos parece ante a dos mais fortes.
Daí facilmente se passa ao
totalitarismo, pois o Estado encontra caminho preparado para exercer uma
liberdade onímoda na direção da vida social, suprimindo a falta dos grupos e
anulando as liberdades individuais.
Foi o cristianismo que ensinou ao
mundo antigo o verdadeiro sentido da dignidade da pessoa humana e da liberdade
em sua ordenação para o fim transcendente e sobrenatural do homem. Sob sua
influencia floresceram as comunidades autônomas e se formaram as monarquias limitadas,
anteriores à centralização do Estado moderno. O liberalismo foi a negação dessa
transcendência e a perda da dimensão social da liberdade, propiciando o surto
da socialização totalitária”.
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José
Pedro GALVÃO DE SOUSA. A Liberdade em sua Dimensão Social, a Proposito da Distinção entre “Liberdade
Abstrata” e “Liberdades Concretas”, in
Filosofar Cristiano, Asociación Católica
Interamericana de Filosofía, Revista Semestral, VIII-IX, n. 15-18, 1984-1985, p.
148-149.
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