terça-feira, 23 de agosto de 2016

O SURTO DA SOCIALIZAÇÃO TOTALITÁRIA

“A filosofia liberal e a do Estado totalitário são duas modalidades do imanentismo moderno no pensamento político. Aí temos, respectivamente, o imanentismo da liberdade e a divinização do Estado, concebido como um absoluto, como a encarnação da ideia ética. A liberdade, para os liberais, deixa de ser ordenada a um fim pessoal transcendente; e concretamente, na perspectiva do totalitarismo, ela resulta da total subordinação dos indivíduos e dos grupos ao Estado, isto é, ao fim imanente deste.
No primeiro caso, a dimensão social da liberdade desaparece. No segundo caso, o homem é inteiramente socializado numa completa ‘estatização’ da vida.
Uma das razões dos fracassos a que se têm exposto as democracias modernas, está em que seus regimes constitucionais, estruturados segundo os princípios do liberalismo desvinculam o homem dos grupos orgânicos, cujo fortalecimento preserva as liberdades e cujo desaparecimento ou enfraquecimento as deixam sem defesa. Em face de tais regimes de uma liberdade meramente abstrata, Hegel percebeu que nesses grupos as liberdades concretamente são asseguradas, mas, fazendo do Estado a síntese absorvente de toda a sociedade, preparou o monismo totalitário.
O liberalismo desconhece o princípio de subsidiariedade, fundado na autonomia dos grupos intermediários: em relação aos quais o Estado deve exercer uma função supletiva, para atender às suas deficiências. Por falta desse enquadramento social, abandona as liberdades individuais umas em face das outras, deixando-as, assim, desprotegidas para enfrentar a concorrência. Dessa forma, na competição da struggle for life, a liberdade dos mais fracos parece ante a dos mais fortes.
Daí facilmente se passa ao totalitarismo, pois o Estado encontra caminho preparado para exercer uma liberdade onímoda na direção da vida social, suprimindo a falta dos grupos e anulando as liberdades individuais.
Foi o cristianismo que ensinou ao mundo antigo o verdadeiro sentido da dignidade da pessoa humana e da liberdade em sua ordenação para o fim transcendente e sobrenatural do homem. Sob sua influencia floresceram as comunidades autônomas e se formaram as monarquias limitadas, anteriores à centralização do Estado moderno. O liberalismo foi a negação dessa transcendência e a perda da dimensão social da liberdade, propiciando o surto da socialização totalitária”.
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José Pedro GALVÃO DE SOUSA. A Liberdade em sua Dimensão Social, a Proposito da Distinção entre “Liberdade Abstrata” e “Liberdades Concretas”, in Filosofar Cristiano, Asociación Católica Interamericana de Filosofía, Revista Semestral, VIII-IX, n. 15-18, 1984-1985, p. 148-149.

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