"Homem
e mulher são diferentes no corpo e na alma, na biologia, no sentir, no amar e
no entender, mas são diferentes para serem um para o outro, e os dois, através
das diferenças e relação mútua, para criação do filho, em que colaboram
intimamente com Deus – eles, os pais, no corpo, em tudo o que o corpo traz à
vida, no sentimento, no coração, quase na alma; Deus, na alma transcendente,
nesse quase que está para além dos pais e os pais, por não serem divindade, não
podem acabar. Os pais lhe dão a terra; Deus, o que está para além da terra, o
destino transcendente dos seres espirituais.
Deus
está presente já na própria concepção dando ao amor dos pais a oferta criadora
duma nova alma. É nesta associação espantosa de Deus e do homem, não dada à
criação em momento algum, que se tornam, homem e mulher, na regra fundamental
do viver humano, à qual tudo deve estar subordinado.
A
família supõe assim, por estes fatos fundamentais, a ordem criada. Deus
colabora na ordem que criou e através dela. Não se sujeita a colaborar numa
ordem criada pelo homem, sem Ele.
A complementaridade,
e diferenciação dos sexos é assim o fato primário, a própria condição de
existência na terra da obra suprema da divindade. Não admira que, num mundo em
que se está a negar a diferenciação e complementaridade dos sexos, se substitua
a graça da criação pela tragédia da destruição das fontes da vida e da própria
vida, como sucede na anticoncepção e nas destruições maciças em que a
humanidade, invocando um amor que não foi criado, se extingue de dia para
dia... o que leva já alguns governos temerem, não o espectro neo-maltusiano da
sobre população, mas o vácuo ainda mais pavoroso da extinção dos seus povos por
falta de procriação.
A
grande ameaça da humanidade de hoje não é o aumento da população que as
máquinas calculam nos gabinetes do planejamento mundial, não são as bombas
atômicas que ainda não conseguiram matar além de escassas centenas de milhares
de vidas; espantosamente, segundo uma evidência em que o senso comum, (por se
Ter completamente perdido, certamente) não acredita, é o aborto, que mata
atualmente milhões e que já matou cerca de 50 milhões de homens nos últimos 20
anos. (P.S.: o presente artigo foi escrito em 1971)
Deus
não colabora com o homem numa ordem criada contra uma ordem que Ele criou, e se
a humanidade, que ainda não destruiu o instinto inicialmente dado, ainda
cresce, não demorará extinguir-se pouco a pouco, em face da maior razia de
vidas que nunca peste ou fome ou guerra lhe trouxe na história passada. Bom
será que o presente século, hipnotizado pela doutrina econômica do
neo-maltusianismo, ao menos, por um imperativo também econômico, considere
urgentemente uma nova doutrina, anti maltusiana agora.
Começa
por divergir a história atual, logo de início, da ordem criada, e também, na
ordem criada, a sentir efeitos devastadores. Pode o homem tentar criar uma nova
natureza, não pode livrar-se da vingança da natureza destruída. As leis que
Deus criou, para todos evidentes, atuam sempre, ou criando, ou destruindo, por
elas mesmas. E estas leis vingam-se implacavelmente, num determinismo cego a
que o homem não pode fugir. É o preço da nova criação".
___ Luis de SENA ESTEVES. Trecho
extraído da Revista católica Hora Presente, Ano III, Dezembro de 1971, n°11,
p.176-177
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