"Todo
direito se funda no critério moral do justo e do injusto inato na razão humana.
O direito natural não foi inventado pela razão, nem fabricado pelos juristas.
Não é imanente mas transcendente. Está na razão, anteriormente a todo direito
escrito. É uma norma de conduta tão sólida como os princípios da inteligência
são uma norma da atividade especulativa e assim como não se pode pensar fora
dos princípios da inteligência, assim também não se pode agir fora do princípio
pelo qual devemos fazer o bem e evitar o mal. Santo Tomás elaborou uma
admirável fundamentação metafísica do direito natural, que é constituído pelos
princípios inerentes à natureza racional do homem; e o direito civil só é
direito quando traduz o direito natural. Os Estados não são a fonte da moral e
do direito e uma lei não é justa pelo simples fato de ter sido promulgada pelo
Estado. Os Estados contemporâneos, oriundos do individualismo com suas raízes
idealistas e do socialismo, com suas raízes materialistas, podem promulgar e
promulgam muitas leis injustas, que ferem os princípios do direito natural. O
Estado individualista, e o Estado socialista principalmente, já são em si
mesmos violações do direito natural que repele, com a mesma energia, o
individualismo e o socialismo.
O
direito natural é um conjunto de preceitos transcendentes que devem reger não
só o comportamento dos indivíduos, mas também a ação dos Estados. É um limite
que se impõe ao poder cada vez maior do Estado, que aniquila, nega, destrói os
mais invioláveis direitos naturais da personalidade humana. O Estado
contemporâneo, fundando-se no incrível pressuposto de que o indivíduo vive para
a espécie e o cidadão para o Estado, se converteu numa sociedade anônima de
fabricação de leis em massa e em série, que não têm na menor conta o fato
essencial pelo qual o Estado não é fim mas simples meio e a personalidade
humana não é simples meio mas verdadeiro fim. Tudo quanto destrói os direitos e
as liberdades concretas da personalidade humana atinge frontalmente o direito
natural, é uma violação da lei verdadeira, que não passará impunemente porque
há de reverter na maior das infelicidades sociais. Só o direito natural é
justo. E um Estado só realizará a justiça social quando todas as suas leis
escritas se fundarem na razão natural, em diametral oposição com as reformas
atuais, que fazem do indivíduo um autômato, da sociedade, um rebanho e da
liberdade, um mito. Pode-se legalizar a injustiça e a fraude; pode-se erigir em
sistema a espoliação da família pelos impostos de transmissão e as partilhas
obrigatórias; pode-se eliminar o direito de propriedade pelos tributos
extorsivos; pode-se proletarizar o trabalhador e gravar o rendimento do
trabalho com taxas excessivas e contribuições calamitosas; pode-se confundir a
educação com a instrução, negando à religião o direito de educar e conferindo
ao Estado o a obrigação inoperante de instruir. Pode-se em suma negar o direito
natural em todos os seus graus. Mas não se pode com isso abolir um profundo
senso de injustiça, nem substituir o direito natural por um direito artificial.
O
Estado tem a força para garantir a execução de suas leis escritas, justas ou
injustas. Mas a ordem natural tem uma sanção muito mais poderosa no fato de que
toda a sua violação é punida pela desgraça geral, pela desordem, pela
instabilidade, pela revolta e pelo caos”.
___ Heraldo BARBUY. In Ecos Universitários
(Órgão Oficial do Centro Acadêmico "Sedes Sapientiae". Ano III, nº
13, São Paulo, setembro de 1950, p. 1).
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